Matéria sobre O Gigantesco Ímã no Diário de Pernambuco:
http://www.pernambuco.com/app/noticia/divirtase/45,28,46,61/2016/03/15/internas_viver,632642/professor-pardal-do-sertao-pernambucano-ganha-cinebiografia.shtml
Professor Pardal do Sertão
pernambucano ganha cinebiografia
Evangelista Ignácio de Oliveira,
inventor e cientista popular natural de Serra Talhada, é o protagonista do
documentário "O gigantesco ímã", em exibição no Cinema São Luiz.
Do outro lado da linha, o senhor
de 88 anos dá pelos menos uma gargalhada por minuto. Parece eufórico. Com a
própria cinebiografia em cartaz nos cinemas, diz estar morrendo de alegria
consigo mesmo. “Tudo no mundo, sei fazer. Não precisa de papel, nem de instrução.
Deus me deu essa sabedoria. Não sou culpado de ter nascido sabendo das coisas.
Se eu disser que o mundo vai se acabar, uma parte não acredita, mas a outra
começa a rezar”. Exageros à parte, é impossível não ser cativado pela simpatia
de Evangelista Ignácio de Oliveira, inventor e cientista popular natural de
Serra Talhada, no Sertão de Pernambuco, protagonista do documentário O
gigantesco ímã, em exibição no Cinema São Luiz.
Sem nunca ter tido acesso à
educação formal, o homem foi relojoeiro por 43 anos até começar a investigar o
funcionamento de rádios e outros mecanismos analógicos. Desde então, dedica a
vida a transformar sucatas de máquinas e equipamentos eletrônicos em instrumentos
os mais diversos (conheça algumas invenções na página). A figura de Vanja, como
também é chamado, fazia parte do imaginário do músico e cineasta Petrônio
Lorena, também serratalhadense. Há algumas décadas, o realizador, na época um
pré-adolescente, observava com atenção a figura excêntrica de roupas gigantes,
cabelos assanhados, sempre em movimento em busca de ferros para seus
experimentos científicos.
Quando finalmente se encontraram,
tiveram início as gravações do curta-metragem O som da luz do trovão (2006),
dirigido também por Tiago Scorza, sobre as engenhocas de Evangelista, hoje
morador de Petrolina. A dupla manteve contato com o inventor depois disso e,
eventualmente, decidiu contar a história com mais detalhes. Bancadas com
recursos próprios (cerca de R$ 40 mil), as filmagens duraram mais de uma década
e acompanharam a intimidade do senhor autodidata, o passo a passo das criações
e a interação com outros inventores (daí o “ímã” do título, uma referência ao
próprio Evangelista).
Em pouco mais de uma hora, o
documentário foge do padrão em vários aspectos, ao se deixar contaminar pela
ousadia e experimentalismo do personagem. Para Petrônio, o longa traduz o
sentimento desse “Leonardo Da Vinci modernizado e ao mesmo tempo primitivo”,
além de homenagear a figura do “outsider”, da pessoa que se sente fora do
padrão da sociedade e não quer obedecer convenções de moral, política,
religião, estética, mas transgredir os valores.
“Evangelista é de família nobre
de Serra Talhada, mas filho bastardo de uma empregada doméstica, então sempre
foi tratado com desdém. Talvez a revolta dele tenha sido transformada em
impulso criativo, em motivação para resolver as coisas ao invés de esperar. Se
ele quer uma máquina filmadora, vai lá e constrói”, comenta Petrônio. Para ele,
essa é a grande mensagem do documentário, a do “faça você mesmo”.
As engenhocas
ELETRICIDADE
Em uma invenção de Evangelista, a
combinação de um ímã circular com arame esmaltado enrolado em bobina produz
energia elétrica, verificada por pequenas lâmpadas de LED que piscam conforme o
equipamento gira em torno de um eixo de madeira.
ÓTICA
Um longo cilindro com vidro fosco
e pequeno orifício. Na invenção, se pode ver paisagem de cabeça para
baixo. Em outro momento, ele monta um artefato simples, com superfícies furadas
para, com o auxílio da luz solar, impressionar a plateia.
ÁUDIO
Peça por peça, construiu rádio
funcional, coberto por acrílico, para permitir enxergar o interior. Equipado
com celular, o rádio pode ser acionado à distância, com uma ligação. Também
criou caixas de som a partir de peças de secador de cabelo.
IMAGEM
Equipada com um motor de
liquidificador e peças de metal, construiu do zero uma filmadora 35mm. Imagens
experimentais captadas foram incorporadas ao documentário. A máquina não só
filma, como projeta. Ou, como ele diz, “vomita o que viu”.
ARMAMENTOS
Inventou modelos de arma, das
mais tradicionais às inusitadas, como as escondidas em carteira de cigarro, ou
em formato de guarda-chuva, bengala, torneira. No longa, conta com ajuda dos
militares para acionar uma metralhadora pelo celular.
LINGUAGEM
Coleciona, em um longo cartaz em
formato de pergaminho, 3500 expressões idiomáticas do idioma inglês, todas em
desuso. No filme, um estrangeiro chega a tirar dúvidas com Evangelista, cuja
memória guarda o significado de todas as palavras ali escritas.
MECÂNICA AUTOMOTIVA
Depois de quebrar a cabeça, o
inventor conseguiu colocar para funcionar um carro movido a energia elétrica. O
único problema foi a falta de autonomia do veículo - conectado a um fio de 50
metros e ligado na tomada, não conseguiu ir mais longe.
AERODINÂMICA
Projetou, na década de 1960, um
modelo de asa-delta, mas foi impedido pelas forças policiais de testá-la. Ele
pretendia saltar de um dos pontos mais altos de Serra Talhada. Foi obrigado a
vender. O comprador testou e comprovou o funcionamento.